6 de fevereiro de 2011

A batalha pelo Egipto




Os manifestantes continuam na Praça Tahrir. A direcção do Partido Democrático Nacional, o partido de Hosni Mubarak, demitiu-se hoje (incluído no lote está o filho pródigo Gamal Mubarak). As concessões que tem feito nos últimos dias são em primeiro lugar e acima de tudo um sinal do medo que o regime tem da mobilização popular. Mas o governo está a agir, dentro dos limites impostos pela situação, de forma calculada. A máquina de propaganda do regime não se poupa a esforços para fazer passar a mensagem que já cederam a quase todos os pedidos dos manifestantes e que a contestação já não tem razão de ser. Mubarak, esse, não se pode ir embora imediatamente senão seria o caos. E ao não ir mantém viva a principal exigência do povo Egípcio que continua presente nas ruas após quase duas semanas de protesto ininterrupto. É uma estratégia que aposta na divisão da população, claramente delineada para afastar do movimento os sectores mais hesitantes da sociedade egípcia, e no cansaço da contestação.

Mas o regime não está sozinho a tomar decisões. A seu lado os Estados Unidos estão empenhados em garantir, como já escrevi ontem, que o essencial dos seus interesses económicos e geoestratégicos permanecem intactos. E embora estes interesses não sejam compatíveis com a instabilidade que o Egipto está a viver, a Casa Branca só pode confiar no actual regime para os defender. O governo americano, que certamente está consciente que a luta de classes não é um conceito morto, percebe que a cada dia que passa os manifestantes endurecem mais a sua determinação e clarificam mais as suas ideias acerca do regime e da cumplicidade dos Estados Unidos em mantê-lo, percebe que cada dia que passa sem Mubarak se ir embora força as pessoas a tomar nas suas mãos a organização da vida social do país, e sabe também que cada dia de concentração na praça Tahrir acende a chama da revolta em mais e mais cidadãos dos outros países árabes. No fundo os Estados Unidos sabem claramente que têm que apressar a reforma caso contrário correm o sério risco de se ver a braços com uma revolução social que contagiaria irremediavelmente o mundo árabe.

Do balanço de forças deste triângulo (o povo em revolta, o governo americano e o regime de Mubarak) terá que sair uma solução nos próximos dias. Se a contestação se mantiver nas ruas em grandes mobilizações o fim de Mubarak estará por horas ou por dias. Se o povo ceder ao cansaço e às tentativas de divisão terá uma reforma light e um elite corrupta que se manterá firme no controlo dos rumos do país mesmo que Mubarak se vá embora em Setembro como já afirmou pretender.

Quanto ao exército, está a adoptar um papel que alguns apelidam de “neutral” e cujo objectivo é manter-se intacto. Tomar partido no actual conflito, seja qual partido for, poderia levar a sérias divisões entre os seus dirigentes. Mas mais temível do ponto de vista dos interesses do imperialismo e do regime, se os oficiais derem ordens para atacar o povo poderão descobrir que muitos soldados se recusarão a disparar, criando assim uma situação de colapso da hierarquia e desordem nas forças armadas. Esse é um teste que nenhum dos generais pretende fazer. Assim, mantêm-se neutrais e abrem caminho para serem a força que pode tutelar a reforma e caso de colapso do governo.


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