7 de março de 2011

A revolução é dos líbios




Os Estados Unidos e a União Europeia estão a avançar rapidamente para a concretização de uma operação militar na Líbia. Como já é hábito, a razão invocada é a defesa dos civis, dos direitos humanos, da liberdade e outras coisas que fica sempre bem defender. A primeira verdadeira razão, que toda a gente conhece e que só os mais fanáticos seguidores do politicamente correcto se recusarão a pronunciar, é o petróleo. A segunda tem a ver com o facto de o ocidente não poder confiar em nenhum dos lados do conflito para garantir o acesso aos recursos energéticos do país. Por um lado, os métodos até aqui usados por Khadafi para lidar com um movimento popular e democrático tornaram-no um líder insustentável. Uma eventual e improvável vitória de só seria conseguida à custa de um imenso banho de sangue que tornará politicamente inviável o restabelecimento do “business as usual”.

Por outro lado os revolucionários não vão em cantigas e mostram uma férrea veia independentista. Estão a estabelecer conselhos que governam a vida nas cidades e esta nova forma de democracia popular não deve ser muito propícia a negociatas. Um exemplo ilustrativo: na última semana, um grupo de comandos e espiões ingleses enviados pelo ministro dos negócios estrangeiros William Hague para estabelecer contactos com os rebeldes em Benghazi, foi capturado, mantido na prisão durante quatro dias e depois expulso do país.

A situação militar no país e o desequilíbrio causado pela capacidade de Khadafi usar a força aérea tem levado inclusivamente alguns rebeldes líbios a apelar a uma zona de exclusão aérea sobre o país. O cenário traz-nos à memória a zona de exclusão aérea que os EUA impuseram ao Iraque durante dez anos, que levaram à morte de meio milhão de crianças e foram a principal alavanca de preparação da catastrófica invasão que se seguiu. A zona de exclusão aérea, mais do que um ataque a Khadafi é o primeiro passo na liquidação da revolução. Hoje já começa a falar-se de uma ocupação que certamente vai impôr ao país instituições e dirigentes “democráticos”.

Khadafi conseguiu recuperar alguma margem de manobra nos últimos dias ao ponto de esta noite já estar a propor negociar com os revolucionários. O seu objectivo é criar um impasse já que as poucas forças que lhe restam não conseguirão estender o seu poder a todo o país sem correr o sério risco de deserções em massa. Khadafi poderá reconquistar algumas cidades onde sabe que é profundamente odiado e não tem qualquer apoio popular. São vitórias com pés de barro. A revolução continua a ter uma tremenda capacidade de mobilização e tem que ter tempo para criar uma força de combate disciplinada que possa resolver o impasse. A intervenção estrangeira vai esmagar a revolução e fazer do povo líbio escravos das empresas petrolíferas. A revolução em curso na Líbia vai certamente causar muitas mortes até conseguir acabar com o ditador, mas basta lembrar o Iraque para perceber que isso será pouco comparado com a catástrofe que virá com a ocupação estrangeira.


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