26 de novembro de 2010

Greve Geral - Rescaldo I




A pretensão de discutir a greve em números é, no mínimo, audaz.
Quando tal desiderato é assumido e materializado por políticos ou jornalistas, a tragédia está assegurada. Sem grandes males, pois que na maioria das vezes assume contornos cómicos, sendo a plebe premiada com pérolas como o anúncio triunfal que o governo protagonizou, ao concluir que a greve não foi um sucesso, por ter sido parcial.
Entramos em definitivo na era digital em que somente assumem valor, os zeros e os uns.
Entre zero e cem nada existe.
Talvez um número acima de três milhões, dir-me-ão outros, obrigando-me a responder que achando a cifra bonita, a vejo como uma hábil fuga à quantificação relativa, da qual por deformação profissional, não abdico.
Não desejaria contudo abandonar o festim dos números sem antes realçar um pequeno aspecto, onde provavelmente radicará a maior dificuldade na contagem dos aderentes à greve e de onde resultarão (na maioria das vezes conscientes) os desvios e desencontros nas contagens.
A definição do universo dos trabalhadores que no dia da greve são efectivamente esperados (espectáveis) e em consequência da sua definição, a aferição exacta da quantidade relativa de trabalhadores em greve.
Não valerá contar trabalhadores de baixa, de folga, em descanso, integrantes de serviços indispensáveis e urgentes e também aqueles que estão em formação profissional, à qual e por mero acaso, nesta semana se assistiu a um “boom”.

Importará pois uma análise qualitativa, que incida sobretudo nos aspectos positivos e negativos que esta greve geral ajudou a revelar e/ou confirmar, tendo sempre em atenção que a base de descontentamento não pode ser toda ela medida por igual.
Na verdade os trabalhadores não são lesados nos seus direitos de forma homogénea, recaindo os mais nefastos efeitos das recentes opções do governo, os cortes salariais, apenas sobre uma minoria dos trabalhadores portugueses, somente sobre uma parte dos funcionários públicos, não sendo portanto de estranhar uma mais modesta adesão dos trabalhadores do sector privado.
Ainda assim, vista sob este prisma e tendo em consideração que esta terá sido a maior greve geral a que Portugal assistiu, não tenho reservas em considerá-la como uma iniciativa de grande alcance e sucesso muito satisfatório.
Na área da educação foram inúmeras as escolas que não abriram.
Na justiça assistiu-se pela primeira vez e com considerável adesão, a uma greve dos funcionários da investigação criminal da Polícia Judiciária.
Na saúde, sector mais melindroso no que à participação na greve se reporta, os números apresentam-se muito acima do usual.
E no sector dos transportes colectivos o sucesso foi quase arrebatador. Tendo-se rompido em definitivo com a muralha dos serviços mínimos. E com uma paralisação total, assistiu-se a uma dinâmica muito próxima da tradição grevista de outros países da Europa.


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