14 de março de 2011

12 de Março: Farsa ou ilusão?







Ainda antes da inevitável pergunta sobre, que fazer a partir destas aparentemente extraordinárias manifestações que ocorreram no dia 12, sobretudo na cidade do Porto, importará reflectir um pouco sobre tudo o que já se disse, leu ou escreveu, a propósito de um acontecimento que, apesar de tudo, se poderá reportar de insólito.
Algures entre um optimismo excessivo, romântico e até patético e um acentuado cepticismo, sectário ou “de vistas curtas”, onde humildemente deixarei que me entrincheirem, guardei na memória um texto deveras equilibrado e lúcido, onde poderão repousar tão neófitas quão revolucionárias consciências, enquanto procuram encontrar respostas para a inevitável questão que a todos agora se coloca.
O texto assinado por “Pedras contra Canhões”, em Autoridade Nacional, tem a virtude de não desprezar o confronto já reportado, que germina na confusão, no vazio, no oportunismo de classe sem consciência de classe e em todas as contradições facilmente perceptíveis nesta mole disforme de gente que realce-se, se atreveu, ao fim de quase quarenta anos, vir ou voltar à rua para gritar. Sem perder o pé, apresenta-nos algumas das possibilidades de conformação a arquitectar, a fim de conseguir fazer desta “coisa”, algo com substância e capital de mudança.
Continuo a não partilhar desse optimismo, apesar de já não me achar tão céptico quanto à substância de que aparenta ser feita esta gente. Continuo ainda, a não me sentir capaz de a considerar minha, por achar que não me acompanhará no próximo dia 19.
Simpatizo com a luta popular. Entusiasma-me a ruptura da inércia, a mesma que os movimentos de solidariedade para com Timor-Leste, foram capazes de promover na década de noventa, culminando com forte contestação juvenil ao paradigma cavaquista e com a rejeição da laranja juventude da moda de então. Alegra-me ver assustados, confusos, irritados e atrapalhados, os “Sousas” desta nação, desde o irascível pateta Miguel Tavares, ao simpático pateta Marcelo Rebelo.
Por outro lado não consigo conformar-me com a pobreza duma gente que apenas se mobilizou para gritar contra, incapaz de dar um sentido e um projecto unificador ao protesto. Fizessem as terapias psicológicas parte do sistema nacional de saúde e não haveria necessidade de tamanha catarse colectiva.
Dos que foram para a rua identifico os de sempre, aqueles que lá estarão na semana que vem. Quanto aos outros… são muitos outros, diria demasiados outros e demasiado juntos.
Velhos intelectuais de esquerda que há muito e para ganharem o pão, voltaram costas à política, reencontrando agora um elixir para os últimos anos de vida que para si adivinham. Tecnocratas e “intelectualoides” de todos os credos e origens, insatisfeitos com um estado de coisas que despreza o mérito em detrimento da cunha, esquecendo todos os outros que a voragem do sistema impediu de exibirem méritos. Skinheads, fascistas, democratas-cristão e jovens populares. Novos cristãos cansados das libertinagens desta putativa esquerda e com vontade de “escuteiramente” ordenarem aquela multidão. E muitos que simplesmente se têm como anti-socráticos, quase todos com a emoção à flor da pele, ou dito melhor, a rebentar-lhes a testa, do despeito e traição que naturalmente sentem.
Nas posturas e aspirações adivinha-se em alguns a alegria de quem já antevê amanhãs que cantam. Os mais pragmáticos já esfregam as mãos perante a oportunidade de refazerem coutadas políticas. Os mais reaccionários convencem-se que o derrube deste regime democrático está para breve.
E os visados, para além do temor, preparam-se já para mascarar as vergonhosas formas com que vêm explorando esta qualificada geração de queixosos, atenuando os efeitos da precariedade, reinventando novas formas de exploração que, até próximo encontro de desenrascados, nos fará achar bem termos tão profícuo sistema económico.
Neste quase transtorno dissociativo de identidade para o qual me empurram as minhas reflexões, ainda me acho com crendice suficiente para pretender separar o trigo do joio, separando o milhão contra a classe política, da geração à rasca, se bem que não tenha a certeza que os próprios o façam com tanta destreza, pelo que ainda merecerão o cognome de desenrascados.
Não se antevendo nada fácil a resposta à pergunta que se impõe, ainda assim é imperativo colocá-la.
E agora?



PS. Despertando novamente o Velho do Restelo que há em mim, diria que bastaria a demissão do engenheiro técnico, para que esta gente se achasse vingada.


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