8 de novembro de 2010

Destas medidas é que o povo gosta, eis o milagre da multiplicação dos pães (ou de como a mentira tem perna curta)





A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição estimou já que a decisão de harmonizar os horários dos estabelecimentos comerciais vai permitir criar 8000 empregos e que terá um impacto de 2,5 mil milhões de euros até 2017.     in Agência Financeira, 24/10/2010

Luís Reis, da Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição, não acredita num aumento significativo de lucro: "O número de consumidores é o mesmo e os rendimentos também. Haverá é mais tempo para escolher quando se quer ir às compras.   in DN Economia, 25/10/2010



O alargamento de horário de abertura das grandes superfícies vai permitir a criação de 8000 (leu bem, oito mil) novos empregos, bem assim como um impacto de 2500000000 € (são muitos zeros? Não conseguiu ler bem? Escrito de outra forma - 2,5 mil milhões de euros) até 2017 – seja lá o que for o impacto.
Todavia e por outro lado, esta medida tão auspiciosa, não passará (segundo os próprios) de um generoso acto de altruísmo, passe a redundância, ajustada ao generoso contexto a que se reporta. Na verdade as grandes superfícies comerciais não terão um aumento significativo dos lucros, já que o consumo não aumentará, nem tão pouco os rendimentos.
Pelos vistos apenas haverá uma mais cuidada distribuição - no tempo - dos clientes pelos ditos espaços comerciais.
Eis onde radica a filantropia do tio Belmiro, esse ilustre mega merceeiro e de seus comparsas.
Na verdade, abdicando de um aumento significativo do lucro, estes senhores propõem-se facultar, aos portugueses, mais tempo para fazerem as suas compras, nem que para tal tenham de contratar novos empregados.
Acredite quem quiser.
Tanto mais quanto, facilmente se concluirá que havendo sensivelmente o mesmo número de clientes, a sua afluência será mais dispersa, possibilitando uma melhor redistribuição dos empregados pelos diferentes postos de trabalho. Nesta manobra radicará o dito milagre da multiplicação.
Com sacrifício dos seus trabalhadores, estas empresas alargarão o seu horário de atendimento, apostando numa fidelização e dependência cada vez maiores dos consumidores, em detrimento do comércio tradicional, incapaz de esgrimir argumentos, contra tais opositores.
Claro está que não faltarão tias a acharem ultra, hiper ou mega vantajoso, terem a possibilidade de fazerem compras a qualquer hora do dia ou a qualquer dia da semana. Não deixarão de existir yuppies a acharem digna de modos de organização planificada da economia, a imposição de regras de higiene no consumo. Claro que sobejarão os intelectuais liberais achando atentatório da liberdade individual, que o Estado pretenda impedir os cidadãos de fazerem compras ao domingo à tarde. Cidadãos coitados, que por vezes apenas dispõem desse dia de domingo para se entregarem à árdua tarefa que é a recolha de vitualhas, porque no restante do seu tempo trabalham ou a espaços, descansam.
Para todos estes não restarão dúvidas que o problema radica nesse malvado Estado putativamente socialista que os oprime, ao ponto de pretender roubar-lhes o tempo que o domingo lhes reservou para as compras.
Maria, compete-te, uma vez mais, escolher entre dois caminhos, prevalecendo mais que na maioria das vezes, a tua intuição.
Intuição de mulher, de trabalhadora, de mãe, de dona de casa, ainda e quase sempre subjugada aos impulsos de uma sociedade patriarcal, que na história reservou o culto para domingo, num passado recente abriu alas à alienação colectiva com o entretenimento da bola ao domingo e agora quer impingir-te também, o consumo para domingo.
Cabe-te fazer a escolha entre a liberdade ou a mecanização, entre o livre arbítrio ou a imposição de modelos comportamentais, entre o usufruto do pleno descanso ou a substituição deste por rotinas roubadas ao tempo que lhes reservavas num passado ainda recente.
E se para tal precisares, lembra-te.
Será a pensarem em ti, que o tio Belmiro e seus comparsas, abrem as suas mega mercearias ao domingo?

2 comentários:

  1. Parece que já estão a pensar em alugar camas nos hipermercados. :-)

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  2. É para nos fazer "perder a cabeça".

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